Perdoe-me o avançado da hora em que escrevo, mas preciso pedir-te um pequeno obséquio. Por acaso lembras das coisas minhas que ficaram contigo? A ponta de encanto, o entusiasmo, o brilho nos olhos e a graça que sentia da vida? Pois então, preciso que as mande de volta.
Mas por favor, não entenda mal: não falo do amor que te dei e guardaste naquela gaveta,no escritório de tua mãe. Não, esse é teu. Foi dado sem hesitação, sem demoras ou condições. Que seja sempre um presente. E que, aliás, te sirva para algo, para acalentar tuas frustrações nas tardinhas de domingo, ou de anedota, à mesa, com as amigas. Claro, volta e meia quero dele notícias, dado que é pedaço perdido de mim. Por vezes sinto, se não falta, um cantinho de saudade.
Mas envia as minhas coisas, se não é pedir demais. Pretendo usá-las sexta-feira, para impressionar certa moça que conheci. Tem olhos negros como os teus, mas cabelos longos. Tem um sorriso bonito como o teu, mas me faz sorrir. Nos encontraremos lá onde te vi pela primeira vez, só que ao sol. Por favor não se ofenda ou magoe: perdoe-me a falta de originalidade e até a indelicadeza.
Ocorre que, antes de original, ocupo-me de ser feliz.